07 fevereiro 2007

Pablo Neruda




Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada [1924]

O corpo da mulher e a natureza, o todo divino na face feminina do ser, do existir. A pena corria leve nas mãos do Neruda de 20 anos, dos 20 poemas de amor, da sua cantiga desesperada...

O amor, as cambiantes duras do crescimento, das ilusões; essas musas encantadoras que no sofrimento fazem brotar fontes de palavras, jorros de pérolas literárias deliciosas...



IV
Recordarás aquela quebrada caprichosa
de onde os aromas palpitantes treparam,
de quando em quando um pássaro vestido
com água e lentitude: traje do inverno.
Recordarás dos dons da terra:
irascível fragrância, barro de ouro,
ervas do matagal, loucas raízes,
sortilégios espinhos como espadas.
Recordarás o ramo que te trouxe,
ramo de sombra e água com silêncio,
ramo como uma pedra com espuma.
E aquela vez foi como nunca e sempre:
vamos ali donde nos espera nada
e falamos tudo o que está esperando.





Cem Sonetos de Amor [2004]


Porque da pena do poeta sairá sempre a expressão dos sentimentos dominantes; das contradições existenciais: puras como a brancura, inatingíveis como o céu, complexas como a luz. Não te amo, não dizia outro poeta* no desespero das contradições, de um querer bruto e fero.

Saberás que não te amo e que te amo
pois que de dois modos é a vida,
a palavra é uma asa do silêncio,
o fogo tem sua metade de frio.

Amo-te para começar a amar-te,
para recomeçar o infinito
e para não deixar de amar-te nunca:
por isso não te amo ainda.

Amo-te e não te amo como se tivesse
nas minhas mãos a chave da felicidade
e um incerto destino infeliz.

O meu amor tem duas vidas para amar-te.
Por isso te amo quando não te amo
e por isso te amo quando te amo.



* Almeida Garrett - "Não te amo" [Folhas Caídas, 1853]

1 comentário:

Anónimo disse...

Palavras bonitas,profundas,contradições que definem e caracterizam os sentimentos e memórias que compõem um livro...que é a nossa vida!

Obrigada mais uma vez por esta partilha!